quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

||| Ações pelo Brasil ||| Escola sem PREconceitos |||

Foto: Pedro Nunes
Ponha-se no lugar do professor: o que você faria se um aluno de nome Roberto pedisse para ser chamado de Roberta? E se ele — ou seria ela? — trocasse a calça comprida pela saia plissada? Agora, imagine que você estuda nessa escola e, ao entrar no banheiro feminino, se depara com Roberto(a) tirando a saia. A Secretaria Estadual de Educação admite: os mestres estão despreparados para enfrentar situações como essas. No combate à discriminação e à evasão de alunos que subvertem o modelo de comportamento heterossexual, educadores têm novo aliado: o livro ‘Diversidade Sexual na Escola’, editado pela UFRJ.

Cinco exemplares da publicação, financiada pelo MEC, estão sendo distribuídos para cada uma das 1.591 unidades da rede estadual do Rio. O texto, do coordenador de Comunicação da Pró-Reitoria de Extensão da UFRJ, Alexandre Bortolini, pretende levar educadores à reflexão. Entre estudiosos da sexualidade, é consenso: deve-se aceitar a identidade de gênero dos alunos. Significa, por exemplo, deixar meninos que se sentem meninas usar o banheiro ‘delas’.

“Ninguém pediria para um cadeirante se levantar da cadeira para assistir às aulas. Por que uma travesti deve abrir mão de sua identidade feminina?”, questiona o livro, produzido a partir de relatos colhidos em oficinas feitas desde 2006 em colégios estaduais.

Um dos objetivos é combater a homofobia. Pesquisas da UERJ e da Unesco apontam a escola como o 3º lugar no ranking de locais de discriminação: um quarto dos alunos não gostaria de ter colegas homossexuais e 40% dos pais não querem que os filhos estudem com gays. A realidade, porém, impõe a convivência. “Há 20 anos, seria impossível imaginar alunos assumidamente gays. Hoje, já tem adolescente bancando essas identidades sexuais, e os educadores não sabem lidar com isso”, observa Bortolini.

Tratada como brincadeira entre alunos, discriminação vira perseguição. Para especialistas, é o primeiro passo rumo à prostituição, que não é, como muitos pensam, um “destino natural” do travesti, mas resultado do processo de exclusão do mercado de trabalho, que se inicia na escola.

Coordenadora do Programa Educação em Saúde da secretaria, Maria Cecília Fernandes de Souza reconhece não haver prática consensual, ficando a critério das escolas a forma de tratar o tema: “Ainda há resistência, tentamos disseminar a idéia de que a escola é para todos”.

Educadora que atua na formação de professores na rede estadual, Tomie Helena Kavakami observa que já há literatura sobre sexualidade que faz ver o aluno como um todo. “A escola esqueceu que o aluno tem corpo. Só leva em consideração o cérebro. Mas o resto também está vivo”, diz.


CONCEITO DIFÍCIL DE SER APLICADO NA PRÁTICA

A teoria de que diversidade sexual deve ser aceita na escola é difícil de ser posta em prática. Embora seja favorável a disseminar o combate ao preconceito, a presidente da Associação de Pais do Instituto de Educação do Rio, Vânia Bittencourt, admite que a homossexualidade ainda constrange. “Não tenho preconceito, mas me sentiria chocada de estar no banheiro e ver entrar um rapaz. E fico constrangida quando vejo duas meninas se beijando. O preconceito existe, e aqui na escola não é diferente”, reconhece, ao defender uma mudança de olhar.

Dar espaço a qualquer que seja a orientação sexual de crianças e adolescentes também encontra empecilhos legais. “Legalmente não podemos modificar o nome na chamada porque a emissão de documentos que comprovem a escoloridade do aluno deve estar em consonância com o registro do jovem”, diz Maria Cecília de Souza, observando, no entanto, que nada impede que, na hora de chamar o aluno, seja acatado o nome social que ele deseja.

Um caso ocorrido em 1994 numa escola estadual do Rio também mostrou o tamanho dos obstáculos enfrentados por estudantes homossexuais. Diante da presença de um aluno travesti, os pais dos colegas protestaram e o caso foi para a Justiça, que decidiu pela saída do estudante. “A escola não soube lidar com a situação”, acredita Cecília.

Setores conservadores resistem à diversidade. Pastor da Igreja Congregacional de Acari, Odalirio Luis da Costa brincou ao saber que o livro ‘Diversidade Sexual na Escola’ está sendo distribuído na rede estadual. “Vou lançar o livro ‘Vem aí o fim do mundo’”, diz. Ele garante que não discrimina homossexuais, mas admite que abomina a homossexualidade.

“Não há como aceitar o homossexualismo como base para uma família, como conceito para nossos filhos. O cristão é contra qualquer concessão a esse desvio. É um caminho perigoso para a escola, onde se forma o cidadão de amanhã”, critica.


DECLARAÇÕES

“Mas precisa? (um aluno travesti usar o uniforme feminino) Tem necessidade disso?” ESTAGIÁRIA DE PEDAGOGIA QUESTIONANDO O MODO DE UM ALUNO TRAVESTI SE VESTIR

“Uma aluna estava fazendo uma bagunça, perturbando, perturbando, aí chegou uma hora em que não agüentei mais e falei: ‘Por que você não pára com isso, vê se fica bem uma menina agindo dessa forma!’. A turma virou e falou: ‘Professor, é um menino’. Aí minha cara foi no chão. Não por eu ter errado o sexo, mas por perceber o quanto de preconceito estava naquela minha fala.” PROFESSOR

“Eu estava num ônibus com uma turma que tinha um aluno afeminado. Nenhum colega o discriminava, ele era o xodozinho da turma. Mas o professor da turma começou a gritar pra ele ‘ô, homo, ô, homo, senta aí, homo sapiens’.” PROFESSORA

“Temos um professor que é homossexual. Uma mãe começou a persegui-lo. Um dia, ela veio reclamar que ele estava usando um celular vermelho. Como podia um professor usar um celular vermelho? Nós só resolvemos o problema quando falamos que a mãe poderia ser processada por racismo. O professor era negro. Aí ela parou. Em discriminação sexual não tem essa barreira, não dá para impedir, pôr limites.” DIRETORA

“Um dia cheguei na  escola e quando ia entrar pelo portão um pai me puxou e falou que eu não podia entrar, que eu era uma anomalia. Veio um monte de pai, mãe e aluno fazer isso também. Daquele dia em diante eu nunca mais voltei pra escola.” JOVEM TRANSEXUAL


Texto de Daniela Dariano
Fonte: http://odia.terra.com.br/educacao/htm/escola_sem_preconceito_214360.asp


Projeto Educação para Promoção do Reconhecimento da Diversidade Sexual
e Enfrentamento ao Sexismo e a Homofobia 

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